segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Duas vidas

Hoje em dia canto MPB. Mas quando comecei a cantar, aos 16 anos, cantava rock. Minha primeira banda, e minha segunda também, eram bandas de rock. Amava Blind Melon (a preferida), R.E.M., Stone Temple Pilots, Smashing Pumpkins, Blur, Oasis. Ah, não posso esquecer do primeiro CD do Rush! Era do meu irmão, mas eu ouvia o tempo todo. Eu adorava outros tipos de música, também (Shakira, JORGE BEN – que teve o último post deste blog dedicado a ele –, Jon Secada, Paralamas...). Mas o rock internacional imperava. Eu simplesmente amava rock, e tinha um estilo de vida bem de acordo com isso: usava camiseta de bandas (a do Led Zeppelin era a favorita), adorava conhecer outros roqueiros, comprava o máximo de revistas nacionais e internacionais sobre o assunto... Respirava rock and roll.
Já falei que era roqueira algumas vezes aqui neste blog, mas hoje repito para falar sobre outra coisa. É que há tempos, em um bate papo com um amigo, este me disse que seria incrível se pudéssemos viver várias vidas em uma; se pudéssemos viver em vários tribos, mudar à vontade. “Como você, por exemplo”, ele disse, “que fazia rock e hoje faz MPB”. E ele discorreu sobre a maravilha que seria se nos permitíssemos fazer o que bem entendêssemos, como se fôssemos várias pessoas em uma só – sem nos preocuparmos com a opinião dos outros. Que grande verdade – seria incrível agirmos assim, sem nos prendermos a estereótipos e sem nos sentirmos presos a algum padrão.
Infelizmente o fato de eu ter me tornado intérprete de MPB foi visto como uma “virada de casaca”; um motivo de vergonha, para algumas pessoas. Certa vez encontrei um conhecido, que também tocava em uma banda, e contei que estava cantando MPB. Aí ele não resistiu: “Ah, um banquinho e um violão, sei como é...”, falando de forma pejorativa. Este veneno me deixou ligeiramente chateada na hora, porque foi frustrante perceber que eu estava sendo julgada em minhas opções e que alguém estava se sentindo de certa forma ofendido com os caminhos que eu havia escolhido.
Mas, voltando, a questão de viver várias vidas é genial. Podemos utilizar esta filosofia de liberdade da melhor forma possível: experimentando coisas interessantes e nos dando a liberdade de conhecermos universos diferentes daqueles que conhecíamos até então. E agora penso: que privilégio! Vivi intensamente o rock, e agora vivo intensamente a MPB. Pois, com esta mudança de preferência musical, veio a reboque também um novo estilo de vida: novas pessoas, novos amigos, novos ambientes. Quem sabe o que viverei amanhã? Escuto e aprecio muito outros tipos de música – africana, francesa, latina –, e o mundo está cheio de novidades a cada dia. Poderei escolher ainda muitas vidas, no que depender de mim.
Costumo dizer que o rock fica “entranhado” em nós, que crescemos ouvindo este gênero. Até hoje componho melodias que vejo que têm uma musicalidade própria do rock, uma cara mais alternativa, menos brasileira. Percebo que minhas atitudes/visões têm muito a ver com esta minha formação musical. Meu primeiro contato com a música foi este, então não é algo pequeno nem é algo que se vá deixar para lá assim, do nada. Mesmo que hoje eu quase não escute rock, acho (na verdade tenho certeza) que esta influência é marcante, e talvez nunca vá embora. E reconheço isso, mas ainda não senti vontade de voltar a cantar rock – acho que em algum momento isso irá voltar em meu trabalho; acho que esta influência ainda terá seu espaço em algum CD meu... Mas são apenas suposições, e nem consigo imaginar agora como isso poderá acontecer.
A questão é que as portas estão abertas. Lembro que ainda na época do Pic-Nic (minha segunda banda) eu já falava isso, sentia isso: não quero me prender. Uma vez, em 2005, no programa Atitude.com, eu disse ao Léo Almeida: “Ok, quem gosta da banda pode tentar classificá-la à vontade... Só não pode ficar chateado conosco caso decidamos mudar nosso estilo!”. Léo riu e perguntou se iríamos tocar um pagode ou algo do tipo – se a banda não tivesse acabado, não duvido que isso pudesse vir a acontecer, afinal adorávamos fazer o que desse na telha. E quais as possibilidades que ainda aparecerão e que exigirão de mim uma cabeça bem aberta e sem preconceitos? Espero que muitas.


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