domingo, 20 de setembro de 2015

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É comum alguém que gosta da minha música vir comentar, depois de ver um show meu ou ouvir o CD: “Você com este som maravilhoso, e tanta coisa ruim fazendo sucesso...” A pessoa que divide isso comigo, acredito, quer me mostrar que valoriza meu trabalho e que acha que mereço mais. Isso é demonstração de carinho, mas há uma crítica a outros artistas que não me toca, e sobre a qual eu nunca tenho nada a acrescentar. No máximo um “pois é”, mais para mostrar que estou ouvindo a pessoa, não necessariamente concordando com o que ela diz.
 Eu, que tenho a felicidade de trabalhar com música, de ter que viver neste ambiente, sou testemunha de que há, sim, trocentos artistas inacreditavelmente bons por aí. Muitos estão numa batalha pesada, mas estão aí, fazendo. Não estão deixando de fazer porque está difícil – estão fazendo menos do que gostariam, mas resistem – ou porque músicas mucho locas (não em um sentido exatamente bom) estejam fazendo sucesso. Em suma: vejo crescer, sempre e cada vez mais, uma cena ótima musical por estas bandas brasileiras.
 Acho que deve ser por isso. Eu sei que há muita música boa sendo produzida por aí. Eu sei que a fertilidade do Brasil no quesito musicalidade é grande. Tem para tudo quanto é gosto, tem letra assim, letra assado, tem alegria, tem melancolia, tem tantas vozes, beleza para dar e vender. E os responsáveis por isso estão aí, prontos para serem ouvidos.  Deve ser por isso que este papo de “coisa ruim fazendo sucesso” não me toca. Porque, na verdade, estas “coisas ruins” são, para mim, muitas vezes, algo como... uma imagem fantasiosa das coisas. Estes artistas têm muito mais a ver com mercado, publicidade e imagem do que com música, mesmo. Quando falamos de música (e música que acontece e resiste mesmo sem grana), há bandas boas saindo pelo ladrão, artistas incríveis que não têm o espaço devido. Às vezes vão cavando espaço e aos poucos vão chegando. Os shows lotados daqueles que são considerados péssimos não são uma preocupação em minha vida. Acho que é exatamente porque estes artistas, para mim, vivem em outro mundo, bem distante do mundo em que vivo. Nem nos cruzamos. Não vou a seus shows, não os vejo na TV (e por que eu veria TV se nela, infelizmente, o maior espaço é do entretenimento – e da informação – que não me interessa?). Estamos em universos muito distantes. Somando-se a isso, ainda tem o fato de que muitos artistas incríveis são, sim, reconhecidos, fazem grandes shows e conseguem viver muito bem de suas artes. Ou seja, as coisas poderiam estar melhores, mas pode-se dizer que também não estão de todo mal.
 Vários assuntos me movem e me interessam dentro da música: a crítica, a relação entre músicos e cantores, a autoconfiança dos cantores... Tópicos que, inclusive, parece que nunca se esgotam em mim. Volta e meia preciso falar deles de novo. Mas em relação a este tema, não, não tenho muito o que dizer.
 Deve ser também porque a cada dia que passa percebo que certos comentários me tocam cada vez menos. Outro dia alguém disse que certo artista, ainda desconhecido do grande público, pretendia fazer um disco só de blues. Mas, por este artista ter uma história dentro de outro estilo musical, a pessoa que me deu esta notícia estava achando aquilo um absurdo. “Ele não pode fazer isso, pois não se firmou ainda, enquanto não tiver firmado não pode mudar assim...”. O que entendi foi o seguinte: este artista já não tem reconhecimento do grande público, nem da crítica, muito menos tem grana. A única coisa que ele tem é a liberdade. Ele deve abdicar disso, seu bem mais precioso, para que finalmente, então, fique sem absolutamente nada? Não posso concordar. Mas mesmo ouvindo isso não me choquei, nem fiquei exaltada. Porque não havia maledicência na fala daquela pessoa, era apenas a opinião dela. Estava indignada de verdade, achando que aquilo não seria bom para o artista. Ponto. Entrou por um ouvido, saiu pelo outro, e se fosse em relação a mim, também. Pode falar que não devo misturar, que não posso fazer assim ou assado. Vou escrever um texto sobre, mas não vou ficar chateada. Porque sei que no meu trabalho mando eu, e nele faço o que bem entender, então não há a menor possibilidade de alguém me convencer a colocar em prática uma ideia que tem muito mais a ver com marketing do que com música. 

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